terça-feira, 29 de dezembro de 2009
Mea Culpa
Gotas pesadas e gordas se esborracham no vidro do carro. Chegam em cadência, pulsam no peito que ecoa pelos membros e lateja sobre as vestes.
Ilumina-se o céu, sucede-lhe um clarão e logo ronca a besta que parece viver no meu estômago (indesejada vizinha de mim que só me revisita sempre que a não quero receber).
Recosto-me no banco... as fibras rangem, queixam-se de me sustentar. As pálpebras descem suavemente, como que me envolvem em concha suavemente no seu regaço.
Cada sopro que me mantém atiça fogueiras que só pareço acalentar.
Hoje existo tanto, que nem me importava de mim, só um tanto (parco intento) só um pouco me esquecer.
O vento clama lá fora, varre as copas e geme... o que me parece uma canção de ninar. No seu berço se arrasta uma folha.
Tolhida pela noite
Colhida pelo vento
Sacudida pelos canteiros
Indigente, segue trôpega, falhando lances de calçada por onde ainda se debate.
Moribunda já nem se detém.
Que mais se lhe resta,
senão um vintém.
segunda-feira, 28 de dezembro de 2009
Meio Mas
Solene, enquadro o rosto entre duas páginas que o ladeiam.
Acabo por ver esses e vírgulas desfocados aqui e acolá.
O que leio em cada segundo é o que ecoa nas chávenas que tilintam e se acotovelam inquietas no balcão. O moinho do café resmunga impaciente. As pessoas vão e vêm e não sabem é estar quietas. O Goucha grunhe e logo soa uma pateada de cascos que retumbam.
(Espero não ter de fingir que leio todas as páginas)
Folheio mais algumas então - não todas (a medo que o intento cogitado se possa por si só esgotar).
Estou numa nova página (igualmente desconhecida). Tusso, como quem aquece a garganta e se prepara para falar. Debruço os olhos na primeira linha e logo me perco na segunda ou terceira palavra - É que nunca fui muito boa a aldrabar. Retomo-a novamente e nisto crio um compasso como quem faz birra e no amuo se baloiça a fim de se sossegar.
Sei que não vens porque te espero. Sei que bem me disseste para te não esperar... que nunca sabes a que horas vens, e que até gostas mesmo é de tardar.
Tardo eu aqui.
Sabes que até acho que já te vi passar.
Acenaste-me distraído... e não me parece que te vás sentar.
Fecho o livro.
Não.
Não te sigo.
Tenho medo de te não encontrar.
domingo, 27 de dezembro de 2009
Porfia
Tenho de ir ainda a algum sítio onde acabei por não chegar.
Por muito que me sobre há dias em que acabo por me restar.
Desfaço na minha companhia. Hoje não me quero recomendar.
É que às vezes chateio-me comigo.(Faço birras que já de mim são difíceis, quanto mais a alguém de aturar)
Insisto que quero as coisas do avesso, e quando as procuro já não lhes encontro o lugar. AAArrrrggggghhhhhhhhhhh!
Permaneço incólume.
As órbitas vigiam em redor. Shhhhhhhh… não
me quero
fazer
notar.
Disfarço, e de esguelha bagunço um pouco mais (em jeito de quem finge arrumar).
Entre dentes ti... ti... titubeio, gesticulo, resmungo!
Alvíssaras! PRAGUEJO!
Revolteio e viro tduo de penras pró ar.
Decaem decrépitos meus braços.
Gáudio! Jubilo no meu peito!
Obra feita! Tudo em pedaços.
(o melhor é pôr me daqui a andar)
Faço cuidado com os cacos,
Detenho-me e logo disparo
(Arre! Que não sei ir devagar).
Tenho de ir a algum sítio.
Arrumo o cabelo em desalinho.
É que não gosto de me fazer esperar.
terça-feira, 22 de dezembro de 2009
Hiato
No bafio da noite a luz subtrai-se das coisas, dissolve-se por entre os dedos... e espreguiça-se lentamente.
A candura dos umbrais esconde-se nas esquinas de soslaio. Pardacentas, as sombras diluem-se furtivamente.
Sigo-lhe os passos e trepo ao alpendre.
Recosto-me no mármore embrutecido. Investigo uma fenda por descaso...
Cresce na luz o meu rosto debelado pelo breu. Varro o horizonte sobranceiro e apenas me demoro nas coisas que quero espiar.
De mim para comigo sorrio.
Faço-me acompanhar
domingo, 20 de dezembro de 2009
Assim, Assim.
Conta-me um segredo ao ouvido.
Há tanto que te não oiço uma história.
Gosto de sentir-te respirar assim no meu pescoço... (Para depois fingir que te dou uma vaga atenção distraída, enquanto soltas notas de suspiros que me fazem sorrir.)
De tudo o que disseste, guardei o dito pelo não dito. (É que às vezes nem sabes o que dizes. Ou sou eu que digo assim, porque não gosto de segredos, nem das histórias que contam a mim.)
Conto do que vejo, escrevo do que não quero ver e falo do que não quero saber.
Não há fins para onde me levo,
e do que me trazes nada resta que levar.
Pelo meio de tanta luz me cego.
São histórias elas, tantas, de quem não se quer ou não te sabe enchergar.
domingo, 6 de dezembro de 2009
Non Voglio Restare
Nunca percebi bem o conceito do "meio termo". Se é termo, não é termo e meio. (Quer dizer, parece que se pode ter um termo. E depois temos de nos ficar a meio.)
Ora, concerteza funciona bem, com quem sabe bem quando deve parar o que já começou e, também sabe, que o melhor é ficar a meio. Ou com quem não sabe porque começou e, sem o porquê, acaba por se deixar ficar pelo meio. Ora... continuo sem saber.Mas não me parece que se encontre um parecer, que explique o que já de si me parece difícil de explicar. (Será que agora me fico pelo meio?)
Se bem que desconheça os termos com que me expresso, não reconheço ainda um termo que me limite os meios.
Se bem que, pode não haver meio de dar forma a coisas que não a têem.
Então, não será o termo que se escolhe, ou o meio a que se recorre, mas porventura a forma como uns tomam conta dos outros (um convém e desconvém ente carícias e estalos, de onde crepitam injúrias e gentilezas).
E Aí... há que aprender a negociar entre aquilo que já se espera,
aquilo que se quer esperar e aquilo por que não se estava mesmo, mesmo nada à espera.
Há quem diga que no meio é que está a virtude.
Virtuosamente, acho que Meio Mundo está a Meio Caminho de lá chegar.
sábado, 5 de dezembro de 2009
Recr(e)io
Primeiro?
Primeiro pensei que não sabia nada e que tudo restava por descobrir. Depois pensei que sabia tudo, e que o mundo não me havia ainda descoberto.
Ergui pedestais.Pavoneei-me ostenciosamente como quem corta primeiro a meta e exibe orgulhosamente o seu troféu.
Passeei-me pelas ruas e pelas gentes, portadora da boa nova, tão cheia de mim que não cabia nos demais.
Tropecei no mundo qual berlinde no meu pé. Virei as coisas de baixo para cima. E as coisas viraram-me de cima para baixo.
Ergui os olhos qual moleque que fita seu herói.
Despiu as vestes que o cobriam de veludos e rendas.
Vi-me assim sem saber por onde me ver.
Quis-me assim sem saber já como me ter.
Baixou os braços e só ali ficava, por não saber mais onde ficar.
Quis-se fruto do acaso. Havia sempre rumado em brumas de falácias que pedia sempre a alguém para inventar.
Aí? Aí fui servente, capataz, mestre d'obras, arquitecto enfim, de paredes que não são a minha casa. Sempre outra onde morar. Mas não a minha.
Fico por aqui hoje, não sei se me quero amanhã.
Fico por aqui amanhã, não sei se o ontem comigo quero levar.
Tanto para onde ir, pouco por onde ficar.
Tanto por escrever, nada por contar.
Depois?
Depois desenruguei uma folha em branco onde comecei a desenhar.
O moleque tinha no bolso o berlinde, e com o Mundo quer brincar. Bolinha de vidro onde se espelha a iris, sedenta de vibrar.
Gira, corre, salta e se depara.
Joga a mão na terra.
O Lance não foi certeiro.(Quem disse que havia sempre de acertar?)
Sacode a mão no calção púrpura desmaiado.
Partículas de pó se agitam no ar.
O dente cerra-lhe o lábio.
De joelho se prostra no chão.
O jogo não vai terminar.
Primeiro pensei que não sabia nada e que tudo restava por descobrir. Depois pensei que sabia tudo, e que o mundo não me havia ainda descoberto.
Ergui pedestais.Pavoneei-me ostenciosamente como quem corta primeiro a meta e exibe orgulhosamente o seu troféu.
Passeei-me pelas ruas e pelas gentes, portadora da boa nova, tão cheia de mim que não cabia nos demais.
Tropecei no mundo qual berlinde no meu pé. Virei as coisas de baixo para cima. E as coisas viraram-me de cima para baixo.
Ergui os olhos qual moleque que fita seu herói.
Despiu as vestes que o cobriam de veludos e rendas.
Vi-me assim sem saber por onde me ver.
Quis-me assim sem saber já como me ter.
Baixou os braços e só ali ficava, por não saber mais onde ficar.
Quis-se fruto do acaso. Havia sempre rumado em brumas de falácias que pedia sempre a alguém para inventar.
Aí? Aí fui servente, capataz, mestre d'obras, arquitecto enfim, de paredes que não são a minha casa. Sempre outra onde morar. Mas não a minha.
Fico por aqui hoje, não sei se me quero amanhã.
Fico por aqui amanhã, não sei se o ontem comigo quero levar.
Tanto para onde ir, pouco por onde ficar.
Tanto por escrever, nada por contar.
Depois?
Depois desenruguei uma folha em branco onde comecei a desenhar.
O moleque tinha no bolso o berlinde, e com o Mundo quer brincar. Bolinha de vidro onde se espelha a iris, sedenta de vibrar.
Gira, corre, salta e se depara.
Joga a mão na terra.
O Lance não foi certeiro.(Quem disse que havia sempre de acertar?)
Sacode a mão no calção púrpura desmaiado.
Partículas de pó se agitam no ar.
O dente cerra-lhe o lábio.
De joelho se prostra no chão.
O jogo não vai terminar.
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